Glúten

Glúten: ruim para quem? Vilã da vez na nutrição, a proteína tem sido eliminada da dieta de muita gente. Mas tirar o pão da mesa não é necessariamente benéfico à saúde

Depois do ovo, da carne vermelha e da frutose, chegou a vez do glúten, proteína presente em trigo, centeio e cevada, assumir o posto de vilão da saúde. Enquanto celebridades atribuem seus corpos magros à dieta sem glúten, alguns especialistas iniciaram um movimento para provar que a proteína faz mal e está ligada ao aumento de casos de doenças graves, como as cardíacas e o Alzheimer. Boa parte do que se alardeia sobre a proteína, por enquanto, é especulação – o glúten não engorda e a ciência ainda não comprovou que ele provoque Alzheimer, por exemplo. Por que, então, alimentos tão comuns como macarrão, pão e molhos passaram a ser considerados uma ameaça à saúde?

O ataque ao pãozinho é consequência da proliferação das dietas desintoxicantes. Elas ganharam força em meados de 2005, incentivadas por livros como Dr. Joshi’s Holistic Detox: 21 Days to a Healthier, Slimmer You – For Life (Desintoxicação holística do doutor Joshi: 21 dias para ter mais saúde e magreza – para a vida, em tradução livre), do terapeuta holístico inglês Nishi Joshi. O glúten é um dos alimentos proibidos de uma longa relação. No Brasil, o programa detox é defendido por alguns nutricionistas, especialmente de uma corrente chamada funcional – baseada em alimentos não só saudáveis, mas especificamente indicados para a prevenção de males. Entre linhas mais ortodoxas da nutrição, essa dieta não tem tanto crédito. Entre os médicos, é raro quem a defenda – afinal, não há evidências científicas contundentes de que funcione.

O glúten tem algumas particularidades que o desfavorecem. Ele está presente em diversos alimentos ricos em carboidratos e com alto índice glicêmico (que elevam a taxa de açúcar no sangue), como pizza e biscoitos, que podem engordar e aumentar o risco de diabetes. Essas consequências, porém, não são desencadeadas pelo glúten em si, e sim pelo açúcar do carboidrato. Logo, não adianta eliminar essa proteína da dieta e continuar consumindo comidas como arroz branco e batata. “Se uma pessoa está acima do peso, não é porque está comendo glúten. E, se emagrece com a dieta sem glúten, não é pela ausência dele, mas pela redução do consumo de carboidrato”, diz Vera Lúcia Sdepanian, chefe da disciplina de gastroenterologia pediátrica da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

O glúten, é verdade, pode ser prejudicial ao organismo – mas, comprovadamente, apenas entre aqueles que sofrem de doença celíaca, que afeta uma em cada 200 pessoas no mundo, segundo a Organização Mundial de Gastroenterologia, caso da atriz Ísis Valverde. Quando um celíaco consome glúten, seu sistema imunológico reconhece a proteína como um inimigo e reage contra ela. Esse ataque atinge o intestino delgado e prejudica a absorção de nutrientes.

Há, ainda, pessoas que não sofrem de doença celíaca, mas que têm intolerância ao glúten. Elas passam mal quando consomem a proteína (diarreia e gases são sintomas comuns), mas não têm o intestino danificado e não sofrem de uma doença crônica. Esse quadro pode aparecer em qualquer um e em qualquer fase da vida, mas ainda não está claro o motivo pelo qual isso acontece.

Para o restante da humanidade, ainda não se provou que comer um prato de macarrão prejudique a saúde. “O glúten é uma proteína complexa, mas o tubo digestivo de pessoas livres de doença celíaca está totalmente preparado para digeri-lo sem qualquer problema”, diz Flávio Steinwurz, gastroenterologista do Hospital Albert Einstein e do Colégio Americano de Gastroenterologia. “Se o glúten prejudicasse a absorção de nutrientes no intestino de todas as pessoas, estaríamos todos desnutridos.”

Do ponto de vista nutricional, não há problema em retirar o glúten da dieta. É possível, até, que esse hábito melhore a qualidade da alimentação, uma vez que o indivíduo pode substituí-lo por opções saudáveis como frutas e legumes. “Se uma pessoa consome muitos alimentos com glúten, talvez deixe de comer outros com melhor oferta de nutrientes. Mas se variar a dieta, mesmo consumindo glúten, todas as necessidades do organismo serão cobertas”

Antes de retirar alimentos com glúten da dieta, é importante ter um diagnóstico médico sobre a presença ou não de doença celíaca. Um estudo publicado em 2012, estimou que 75% dos celíacos não sabem que têm a doença – e que a maioria das pessoas que resolvem seguir uma dieta sem glúten não recebeu o diagnóstico da condição.

Deixar de ingerir glúten pode dificultar a detecção da doença, já que o exame de sangue não vai conseguir identificar a presença de anticorpos que só aparecem quando há contato com proteína. A importância do diagnóstico está no tratamento: celíacos não podem consumir alimentos com glúten ou que tiveram algum contato com a proteína. As complicações da doença incluem osteoporose, problemas de tireoide e até alguns tipos de câncer.

Fonte: Veja

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